Nos últimos dias tenho me indagado sobre esperança e felicidade. Casualmente assisti a uma aula de filosofia sobre liberdade e interessei-me pelo assunto a ponto de pesquisá-lo em livros e internet. Fiquei feliz ao encontrar em Marilena Chaui uma síntese das três - esperança, felicidade e liberdade - e aqui transcrevi a parte que mais chamou minha atenção:
Só a leve esperança, em toda a vida,
Disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.
O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada
E que não chega nunca em toda a vida.
Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim: mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos.
Disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.
O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada
E que não chega nunca em toda a vida.
Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim: mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos.
(Velho tema – Vicente de Carvalho)
O poeta começa dizendo que somente a esperança disfarça a dor de viver e esse disfarce significa que a existência não é senão uma “esperança malograda”, pois esperamos pela hora da felicidade e essa hora nunca chega, é sempre adiada. Mas por que nosso malogro? Por que não obtemos a felicidade?
Retomando uma imagem da mitologia grega, a árvore do fruto de ouro, inalcançável pelos mortais (e conquistada pelo semideus Hércules), o poeta estabelece um contraste entre o substantivo “pomos”, isto é, frutos, e o verbo “pomos”, isto é, a ação de colocar alguma coisa em algum lugar. Com isso, contrasta a “esperança malograda” de felicidade – a inalcançável “árvore de dourados pomos” – e a felicidade que “existe, sim”, mas que não alcançamos porque “nunca a pomos onde estamos”, embora esteja “sempre apenas onde a pomos”. Nossa alma fica desterrada no sonho, exilada do real, porque incapaz de reconhecer que a felicidade não é a hora sempre adiada, situada num futuro incerto, não é uma árvore distante, posta pelos deuses em algum lugar não localizável do vasto mundo, mas está em nós, em nossa “leve esperança”, em nosso mais vasto coração, dependendo apenas de nós mesmos, “porque está sempre apenas onde a pomos”.
CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. 13ª edição. São Paulo: Ática, 2005.
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